Noruega, Alemanha e a Amazônia: A questão ambiental no Brasil (Parte 1)



A questão ambiental sempre foi um tema muito delicado. No Brasil, o foco da questão ambiental gira em torno da Amazônia e da questão do controle do desmatamento. Nos debates internacionais o foco não é diferente, quando se debate o tema em relação ao Brasil que, aos olhos do mundo, se resume à Amazônia. O assunto voltou a ganhar relevância depois da eleição de Jair Bolsonaro para a presidência da República, já que o presidente sempre se mostrou favorável à exploração dos recursos naturais, o que não significa que tenha uma postura contrária à preservação ambiental. O presidente chegou a ser alvo de protestos por parte do grupo ambientalista Greenpeace, durante a sua viagem à Israel.

Protesto contra Bolsonaro, durante viagem à Israel

Nos últimos dias, temos acompanhado os desdobramentos da decisão do governo brasileiro de extinguir dois comitês de gestão do Fundo Amazônia, o Comitê Orientador (COFA) e o Comitê Técnico do Fundo Amazônia (CTFA). Por ter sido uma decisão tomada unilateralmente pelo governo brasileiro, causou a reação da Noruega e da Alemanha, os maiores doadores do fundo. Criado em 2008, o Fundo Amazônia é um programa de financiamento de ações que visam a proteção, preservação e o combate ao desmatamento da floresta amazônica, que é a maior floresta tropical do planeta, através de doações feitas por países e empresas. Até 2018, 103 projetos foram beneficiados com recursos do fundo, que são destinados a ações realizadas na chamada Amazônia Legal, área que engloba todos os estados da região norte, o estado de Mato Grosso e parte do estado do Maranhão, embora as regras do fundo permitam que 20% dos recursos possam ser utilizados para ações de preservação em outras regiões e até em outros países. Os recursos podem ser destinados ao financiamento de projetos de organizações não-governamentais (ONGs) e também projetos dos governos federal, estadual ou municipal.

Os recursos para uso do fundo são captados e geridos pelo Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES). Este ano o fundo não aprovou nenhum novo projeto, pois o Ministério do Meio Ambiente está realizando uma auditoria do fundo. O ministro do Meio Ambiente, Ricardo Sales, alega que foram encontrados indícios de irregularidades em contratos, tais como problemas nas prestações de contas, falta de licitações e excesso de gastos. O ministro também defende uma mudança na forma de gerir o fundo, querendo usar parte dos recursos do fundo para pagar indenizações a proprietários privados que tiveram suas terras desapropriadas em áreas protegidas. É importante deixar claro que é o governo quem gerencia os recursos do fundo, através do BNDES, portanto o dinheiro doado NÃO vai diretamente para ONGs, como muitos pensam.

Até hoje, o Fundo Amazônia recebeu um total de R$ 3,4 bilhões em doações. A Noruega é o maior doador do fundo, com R$ 3,1 bilhões doados em 10 anos, seguida pela Alemanha, que doou R$ 200 milhões e pela Petrobrás, que doou R$ 17 milhões. Devido à paralisação das atividades do fundo e do anúncio feito pelo Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (INPE), que houve aumento do desmatamento na amazônia, os governos da Noruega e da Alemanha cancelaram o envio de novas doações, nos valores de R$ 133 milhões e R$ 155 milhões respectivamente. A Alemanha não enviava doações desde 2017. O anúncio feito pelo INPE gerou controvérsia dentro do governo, recebendo críticas do presidente Bolsonaro, e culminando com a demissão do diretor do instituto, Ricardo Galvão. Para receber recursos para o fundo, o Brasil precisa comprovar que houve redução no desmatamento na amazônia, e estes dados são divulgados pelo INPE. Quanto maior a redução no desmatamento, maiores os valores que podem ser obtidos através das doações.

Ao saber do cancelamento das doações ao fundo, anunciado pela Noruega, o presidente Jair Bolsonaro ironizou dizendo: "A Noruega não é aquela que mata baleia lá em cima, no Polo Norte, não? Que explora petróleo também lá? Não tem nada a oferecer para nós. Pega a grana e ajuda a Angela Merkel a reflorestar a Alemanha". O presidente também já tinha ironizado a Alemanha sobre a suspensão de doações: "Eu queria até mandar recado para a senhora querida Angela Merkel. Pegue essa grana e refloreste a Alemanha, tá ok? Lá tá precisando muito mais do que aqui".

É óbvio que estas declarações deram o que falar, dentro e fora do Brasil. Mas o presidente tem razão? Agiu corretamente? Agora que já temos um pequeno panorama dos fatos, vou para a minha análise. Sempre lembrando que não sou jornalista e nem especialista em nada, apenas alguém que forma sua opinião segundo tudo o que circula nas redes de notícias, e depois de muita pesquisa.

Não considero que as falas do presidente Jair Bolsonaro estejam erradas. Concordo que poderiam ter sido ditas com outras palavras, num tom mais diplomático, mas este é o nosso presidente e é assim que ele se comunica. Não vou analisar o mérito disto. Quanto ao conteúdo das falas do presidente, concordo com ele. Quando o presidente ironizou a Alemanha, os alemães responderam divulgando na internet um vídeo mostrando os parques nacionais e áreas de preservação alemães. Tudo muito bonito, realmente. Mas temos que lembrar aos alemães que a nossa Amazônia, a área de floresta virgem e intocada que temos, é maior que a Alemanha inteira!! Nenhum parque nacional alemão se compara em tamanho e diversidade com a floresta amazônica. Além disso, a Alemanha emite muito mais CO₂ que o Brasil. A questão ambiental na Alemanha é mais grave do que no Brasil. Ela é o maior emissor de gases do efeito estufa na Europa e enquanto 80% da energia consumida no Brasil provém de fontes renováveis (hidráulica, solar, eólica, biomassa), na Alemanha este índice está em 40%, com a meta de aumentar este índice para 65% até 2030, sendo que a maior parte da energia consumida na Alemanha provém de usinas termelétricas a carvão. E para piorar as coisas, usinas termelétricas como a usina Jänschawalde, em Brandenburg, produzem energia através da queima do linhito, o chamado carvão marrom, extraído em minas a céu aberto e considerado o mais poluente combustível não-renovável. No ano passado, a última mina de extração de hulha, uma outra forma de carvão, menos danosa que o linhito, encerrou as atividades. A política ambiental alemã foca principalmente na produção de energia, e tem planos para reduzir drasticamente a dependência do carvão. Estes planos esbarram em dois problemas: o primeiro problema ocorreu após o acidente nuclear de Fukushima, que levou Angela Merkel a acelerar o fechamento de usinas nucleares no país, aumentando a produção de energia através da queima de carvão e combustíveis fósseis para compensar. O segundo problema é que a indústria carvoeira gera muitos empregos, e muitas cidades dependem dela, e seria preciso que estes empregos migrassem para outros setores da economia, para mitigar o impacto social da suspensão do uso do carvão. Além deste problema envolvendo a produção de energia, a política ambiental alemã não foca fortemente nos transportes e na indústria automobilística, muito forte no país. Por este motivo, as emissões de gases do efeito estufa não estão caindo como planejado, e em 2020 a Alemanha não cumprirá a meta de reduzir em 40% as emissões, baseando-se em dados de 1990. Um fracasso considerável de sua política ambiental, mesmo com os altos investimentos realizados. Diante disso, parece lógico que a Alemanha se preocupe mais com seus próprios problemas ambientais, já que não tem autoridade para querer criticar as políticas ambientais de outros países.

Agora, a Noruega. O presidente Bolsonaro citou a caça às baleias, prática feita de forma recorrente pelo país. Em resposta, a Noruega afirmou que a caça às baleias é legal e tudo é feito com muito controle. A questão do desmatamento no Brasil também envolve a legalidade. Os dados divulgados pelo INPE mostram o desmatamento geral, mas não distingue o desmatamento legal do ilegal. Existe desmatamento legal? Sim, existe, está previsto no Código Florestal Brasileiro, que estabelece em quais áreas e de que maneira as florestas podem ser exploradas. Desta forma, ao criticar o aumento do desmatamento no Brasil, o governo da Noruega está ignorando consciente ou inconscientemente, esta distinção. Da mesma maneira que eles caçam baleias legalmente, nós também exploramos legalmente as nossas florestas. Mas o mais grave no caso da Noruega, a meu ver, é o fato de o governo norueguês ser o acionista majoritário da mineradora Hydro, que opera na região do município de Barcarena, no Pará, produzindo alumínio, cujo principal comprador é a... Alemanha!!!. A empresa possui duas subsidiárias, a Alunorte e a Albrás, todas atuando na área de mineração e produção de alumínio. A Hydro é alvo de denúncias do Ministério Público do Pará e responde a quase dois mil processos, envolvendo principalmente a contaminação de rios e nascentes, e de comunidades ribeirinhas.

A Hydro foi multada em R$ 17 milhões pelo IBAMA, em 2009, devido ao transbordamento de lama tóxica de uma de suas barragens de armazenamento e até hoje não pagou o valor devido. Além disso, foi descoberta a existência de um duto clandestino que despejava resíduos não tratados diretamente nas nascentes do rio Muripi e no ano passado, um novo caso de vazamento de uma barragem que continha soda cáustica e metais pesados, resíduos da produção de alumínio, também veio à tona. As autoridades embargaram barragens da empresa, que operavam sem licenciamento. Ou seja, a empresa cujo dono é o governo norueguês, não é um exemplo de cuidado com o meio ambiente, e a Noruega age com hipocrisia, ao criticar o suposto aumento do desmatamento enquanto polui rios e nascentes, colocando em risco não só o meio ambiente amazônico, mas também a vida de todos aqueles que dependem dos rios para viver.

A atuação do governo brasileiro na área ambiental tem sido positiva, a despeito das críticas que vêm sendo feitas tanto dentro como fora do país. Existe muita mistificação em torno das questões ambientais, e se trata de um tema complexo e muito importante, que não pode ser debatido através de estereótipos ou de visões distorcidas. Eu acredito que a exploração do meio ambiente deve ser feita de forma sustentável. Não se pode proibir totalmente a exploração das florestas e do meio ambiente, pois dependemos dos recursos naturais para sobreviver. É outra hipocrisia defender a total preservação ambiental. Como produziremos os alimentos necessários para alimentar 200 milhões de brasileiros se não pudermos explorar os recursos naturais? Toda a economia depende do uso de recursos naturais, seja para a produção de energia, seja para a agricultura, pecuária ou para as atividades industriais. O uso dos recursos naturais e a exploração do meio ambiente deve ser feita de forma controlada, para garantir que o impacto ambiental seja o menor possível e para garantir que os recursos não sejam utilizados até exaurir a natureza, o que prejudicaria a própria sociedade que depende destes recursos. Sustentabilidade, essa é a palavra. De tudo o que escrevi até aqui, de todos os problemas mencionados, uma coisa positiva podemos extrair: o debate sobre o meio ambiente veio à tona, e será benéfico discutir propostas para melhorarmos a exploração e a preservação ambiental no Brasil.

Com informações da: BBC News e Deustsche Welle

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