A Questão Ambiental no Brasil - Parte 2


Como escrevi no artigo anterior, a questão ambiental é muito complexa. Para muitas pessoas porém, resume-se a evitar o desmatamento da floresta amazônica. Quando se fala em preservação ambiental no Brasil, a maioria das pessoas tende a reduzir o Brasil à Amazônia, esquecendo-se que temos outros importantes biomas, como a Mata Atlântica, o Cerrado e o Pantanal. Desde a posse do presidente Jair Bolsonaro, a questão ambiental no Brasil foi colocada na berlinda, com muitas pessoas, organizações e até países acusando o presidente brasileiro de ser permissivo em relação à destruição da floresta amazônica. Os episódios mais recentes desta história envolvem o Fundo Amazônia e a suspensão de doações que seriam destinadas a este fundo pelos governos da Noruega e da Alemanha. Tratei disso no artigo anterior.

Em primeiro lugar, devemos entender de uma vez por todas, que o Brasil não é negligente em relação às questões ambientais e à preservação do meio ambiente. Temos muito trabalho a fazer nesta área, isto não se pode negar. Mas como já mencionei, são questões complexas e que precisam ser enfrentadas em várias frentes. Preservação do Meio Ambiente não pode se resumir ao combate ao desmatamento da floresta amazônica. Óbvio que devemos combater o desmatamento, não só na Amazônia, mas em outras florestas também. Mas esta é uma questão que envolve diferentes fatores, e muitos estão sendo solenemente ignorados, tanto pela mídia alarmista, quanto pelas entidades pró preservação, e até pelo governo.

Prova de que o Brasil não é um país negligente em relação ao meio ambiente é a nossa produção de energia elétrica. Aproximadamente 80% da energia elétrica consumida no Brasil é de origem renovável (hidráulica, solar, eólica, biomassa), índice muito superior a da maioria dos países desenvolvidos. Embora o Brasil seja dono da décima maior reserva de carvão mineral do mundo, este mineral responde por apenas 6% da matriz energética brasileira. Em termos gerais, 43,5% da nossa matriz energética usa fontes renováveis de energia, enquanto a média mundial está em 14% (Fonte: EPE-Empresa de Pesquisa Energética, ano base 2016). 

Usina Hidrelétrica de Itaipu, uma das maiores do mundo


Além de possuir uma matriz energética muito mais limpa que a média mundial, o Brasil é um país líder em tecnologia de biocombustíveis, sendo o segundo maior produtor mundial de etanol. Desde 1976, NENHUM carro brasileiro usa gasolina pura como combustível, já que a partir daquele ano a mistura de álcool (etanol anidro) na gasolina se tornou obrigatória. Um ano antes, surgia o Pró-Álcool, programa governamental que visava incentivar o uso do etanol como combustível para automóveis, como forma de diminuir a dependência brasileira do petróleo. O mundo vivia naquele momento as consequências do choque do petróleo de 1973. Apesar dos altos e baixos deste programa, o Brasil possui até hoje veículos utilizando etanol, sendo que a nossa indústria automobilística desenvolveu a tecnologia Flex, que permite que atualmente os carros rodem utilizando uma mistura de gasolina e etanol em qualquer proporção. O etanol brasileiro é produzido a partir da cana-de-açúcar, cujo bagaço também é utilizado como fonte de energia (biomassa). Anos de pesquisas permitiram ao Brasil desenvolver tecnologia que aumentou a produtividade dos produtores de etanol, além da qualidade do combustível. Além do etanol, o Brasil é um dos maiores produtores mundiais de biodiesel.

Unidade da Petrobrás Biocombustíveis


Citei estes exemplos para mostrar que o Brasil está longe de ser um vilão do meio ambiente. Já enfrentamos problemas ambientais sérios. Na década de 80, o município paulista de Cubatão era considerado o mais poluído do mundo. Os níveis de poluição eram tão altos que foram registrados casos de anencefalia neonatal, crianças que nasciam sem a formação do cérebro. A vegetação da Mata Atlântica que cobria a Serra do Mar próximo da cidade desapareceu, por conta da poluição. O rio Cubatão era um rio morto. Depois de medidas duras, que incluiu o fechamento de fábricas do porte da francesa Rhodia, e o reflorestamento da Serra do Mar com espécies nativas, a cidade conseguiu reverter a situação, sendo reconhecida hoje como exemplo de recuperação ambiental.

O exemplo de Cubatão nos mostra que o tema da preservação ambiental está sendo tratado de forma equivocada. Não se pode tratar de meio ambiente sem levar em consideração as pessoas. Meio ambiente é mais que florestas. Inclui também o saneamento básico, já que os rios ainda são tratados como canais de esgoto a céu aberto em muitas cidades brasileiras, como São Paulo. Inclui também a pesca, a caça, a criação extensiva, a agricultura, a produção de energia, a mineração, as atividades industriais, o crescimento das cidades, o oceano e a qualidade do ar.

Por isso afirmo que preservação ambiental é uma questão complexa. Não existe a menor chance de se preservar 100% do meio ambiente. Isto seria o equivalente a condenar a raça humana à extinção. Nós dependemos dos recursos naturais. Todos precisamos compreender que todas as atividades necessárias para a manutenção da nossa civilização dependem de recursos naturais e seu uso deve ser feita de forma sustentável, de maneira a extrair os recursos naturais de que precisamos, reduzindo o máximo possível o impacto causado à natureza. Um exemplo positivo que o Brasil pode dar, está em nosso setor agrícola. Estamos entre os maiores produtores mundiais de soja, milho, café, etanol, suco de laranja, açúcar. E chegamos a este patamar através da pesquisa e do desenvolvimento de novas técnicas de plantio e novas variedades de plantas, que permitiram ao Brasil aumentar a produtividade sem precisar aumentar drasticamente a área plantada, não sendo necessário devastar florestas para criar novas áreas de plantio. Além disso, nossos produtores rurais estão sujeitos ás regras rígidas do Código Florestal.

Existe desmatamento? Sim, existe. Mas é necessário que seja feita a devida distinção entre o desmatamento ilegal e o legal. Muito se tem falado sobre as queimadas que estão acontecendo em muitos locais no norte do Brasil. Infelizmente esta é uma prática ainda muito utilizada por agricultores para a limpeza do terreno, como preparativo para o plantio. Ocorrem queimadas todos os anos. Não é algo aconselhável, é necessário um trabalho massivo de conscientização junto aos agricultores destas regiões para que a prática seja evitada, e o uso de multas para inibir e para punir aqueles que insistirem nesta prática. Mas para isso é necessário que o governo tenha pessoal para inspeções e fiscalizações.

Queimadas, prática recorrente em muitas regiões do país


Uma área na qual infelizmente ainda temos muito trabalho a fazer é a área do saneamento básico. Distribuição de água tratada, coleta de lixo e coleta e tratamento de esgoto, estão longe de atender a todos os brasileiros. Além de ser uma questão ambiental, é também um problema de saúde pública. Nas regiões Norte e Nordeste do país, o índice de domicílios com acesso à água tratada, coleta de lixo e coleta de esgoto, está a menos da metade do total de residencias. Universalizar o saneamento básico também é uma questão ambiental. Coletar e tratar o esgoto, que atualmente é despejado diretamente nos rios e nascentes, é mais que necessário, não só para proteger o meio ambiente, mas também para preservar nossas fontes de recursos hídricos. E aqui não se trata apenas do esgoto doméstico, mas também do industrial. Água limpa é necessária para o consumo humano e também para diversas atividades econômicas. Mas nossos governantes não parecem dispostos a investir em obras que ficam enterradas , sem que ninguém veja, que não possam ser inauguradas com uma cerimônia pomposa e com a cobertura da mídia. Além disso, a MP 868 que criava um novo marco legal para o saneamento básico, abrindo o caminho para que empresas privadas pudessem operar no setor, hoje dominado por empresas controladas por estados e municípios, caducou no Congresso Nacional, devido à pressão de governadores e prefeitos, descontentes com as mudanças. Enquanto isso, a saúde das pessoas e o meio ambiente continuam sendo relegados ao esquecimento.

Saneamento básico: um dos nossos maiores desafios ambientais


Coleta e tratamento do lixo doméstico, hospitalar e industrial também é importantíssimo. Reciclar o que for possível, ajuda a preservar recursos naturais. Hoje o Brasil é um dos maiores recicladores mundiais de latas de alumínio, de papel e de vidro, mas ainda temos muito o que fazer. A visão dos lixões das metrópoles brasileiras é de desanimar qualquer um. A busca por soluções para um descarte de resíduos que seja economicamente viável e ao mesmo tempo, ecologicamente correto, é outro desafio que temos que encarar.

Recipientes para coleta seletiva de lixo


Consumo eficiente de energia, geração de energia renovável, redução no uso de combustíveis fósseis, uso consciente da água, coleta e tratamento de esgotos e de lixo, reciclagem de detritos, modernização de processos industriais, para consumir menos energia, água e matérias-primas. Aumento de produtividade no campo, produzindo mais na mesma área plantada. Incentivo ao uso de transporte público de massa, incentivo ao uso de veículos não poluentes e que utilizem combustíveis renováveis. Substituição do plástico e incentivo ao uso de materiais biodegradáveis ou recicláveis. Enfim, são muitas as frentes na batalha pela preservação ambiental. O grande empecilho é o custo da adoção de certas medidas. Nós vimos recentemente o presidente Donald Trump anunciando a retirada dos Estados Unidos do Acordo do Clima de Paris. O principal motivo foi o temor do presidente que as restrições na emissão de gases do efeito estufa pudessem afetar de forma negativa a economia americana. 

Usina Solar Flutuante no lago da Hidrelétrica de Sobradinho


Como conciliar preservação ambiental com desenvolvimento econômico? Para países em desenvolvimento como o Brasil, é uma questão difícil de responder. Mas não pode ser ignorada. Tampouco podem ser adiadas medidas para combater a poluição ambiental e para promover a recuperação de áreas degradadas. Mas as medidas e os projetos devem ser levados a sério, e não ficar como o Projeto Tietê, que tinha como objetivo despoluir um dos principais rios do estado de São Paulo, que já consumiu bilhões em investimentos e está longe de ter uma data prevista de conclusão. Concordo que se trata de um projeto de longo prazo, mas é diferente de ser  um projeto sem prazo!

Além disso, as pessoas e entidades não governamentais de defesa do meio ambiente não deveriam perder tempo e dinheiro brigando por causas que trazem pouco ou nenhum resultado prático, tanto para o meio ambiente, como para a sociedade. Fala-se muito sobre as queimadas na Amazônia, mas elas acontecem ANUALMENTE há décadas, e pouco tem sido feito para a conscientização das pessoas que vivem naquela região e que ainda usam esta prática nociva. Falta fiscalização por parte do governo? Certamente que falta! Mas já que estas pessoas e estas organizações se dispõem a lutar pela preservação ambiental, que lutem pelas causas corretas e não pelas causas mais fáceis. Muitas pessoas e muitas organizações deveriam rever seus conceitos e seu modo de agir, pois muitas vezes são apenas retórica para redes sociais. Ativismo virtual pode ser positivo em outras áreas, como na política, mas para a preservação ambiental, sair a campo ainda é o melhor a se fazer.

Pessoas, governos e entidades não governamentais devem unir forças e buscar soluções com seriedade e bom senso, levando-se em conta os problemas locais, de cada comunidade, de cada região. Num país de dimensões continentais como o Brasil, não é possível adotar soluções únicas para todos os assuntos que envolvem a questão ambiental. Mas repito, embora seja um assunto complexo e que exige soluções igualmente complexas, não podemos ignorar a questão ambiental. A sobrevivência da nossa sociedade, no longo prazo, depende daquilo que fizermos agora!

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